10 DESEJÁVEIS VIRTUDES PARA A POLÍTICA CULTURAL DO PT NO ESTADO
Sexta virtude: Respeito e Compromisso com a Cultura Popular. Texto: Pedro Nelito, professor, sociólogo e mestrando em Direito.
Endereço do blog do autor: Blog do Pedro Nelito
Solicitado para escrever sobre uma virtude que deveria constar na atuação do governo petista durante sua administração no Estado do Pará, no que concerne ao campo da cultura, escrevo sobre o respeito e o compromisso com a cultura popular.
É possível existir cultura a serviço da política e política a serviço da cultura? Muitos estudiosos sustentam que tudo depende do compromisso de quem tem o poder de decisão; o aspecto político se manifesta sobremaneira.
Assim como pode existir política para proibir, cercear, direcionar, também pode existir a organização para o incentivo, para a criação, para o esclarecimento...
Com a nova administração estadual se renovam a esperança e os votos de que os segmentos populares possam ter vez e voz.
Para iniciar é necessário dizer que, nessas poucas linhas que se seguem, entende-se cultura como produção ou manifestação voluntária, individual ou coletiva, que busca a ampliação do conhecimento através de uma elaboração artística, de um pensamento ou de uma pesquisa...
É importante lembrar que nos albores da civilização ocidental a cultura como manifestação de um conhecimento passou a instrumentalizar o poder, a justificá-lo; nesse caso estamos falando de Roma Imperial. A partir e durante o governo de Otávio Augusto (
Historicamente, é possível identificar a atividade cultural sendo tutelada ou proibida pelos poderosos de plantão. Em alguns momentos o enaltecimento do poder, noutros o questionamento da opressão e a busca da liberdade; a capitulação diante da força e o renovar das esperanças com novos confrontos.
O pensamento de Galileu Galilei foi considerado subversivo para a sua época, um conhecimento que mexeu com o universo. Argumentava Galileu que a terra era redonda e girava em torno do sol, além de o universo ser infinito. O conhecimento produzido por Galileu não mexeu apenas com o universo, mexeu com o poder. Daí ter sido ameaçado com a fogueira, naquela época, e como conseqüência ele teve que abjurar o conhecimento produzido.
Trazendo essa reflexão para mais perto de nossas inquietações cotidianas, após a consolidação do capitalismo, surgem novas classes sociais: burguesia e proletariado. As novas classes apresentam percepções distintas em relação ao mundo, homem, família e etc. Com a industrialização e os grandes centros urbanos, nos confrontamos no campo cultural com produções distintas também. Temos uma dualidade.
O século passado foi o século das revoluções. A disputa ideológica fez do campo cultural lugar privilegiado para a disputa da hegemonia da sociedade.
Capitalismo e comunismo açoitaram a humanidade com produções culturais que buscavam a satanização do campo adversário, em detrimento daquelas manifestações que iam ao encontro do que existia de mais humano na sociedade, possível de ser encontrado em ambos os campos.
No caso brasileiro, mais especificamente o Estado do Pará, após a retirada dos militares do poder, vive-se, durante o período de redemocratização, uma preocupação de retomar e dar vazão às expressões populares. Não houve uma planificação no que concerne ao campo cultural. Não existiu política cultural que possibilitasse o investimento de recursos na perspectiva de gerar uma autonomia aos vários grupos de difusão das mais variadas expressões culturais já existentes à época. Não se planejou ou se concebeu outros meios de captação de recursos para a manutenção dessas manifestações populares organizadas.
As manifestações populares, chamadas, também, de cultura popular, expressam anseios e em algumas manifestações denunciam mazelas que se abatem sobre os segmentos populares.
Na história mais recente, precisamente nos últimos 12 anos de política cultural do governo tucano, presenciou-se uma ausência de política que viesse a organizar as manifestações populares na direção do que foi exposto acima. No lugar disso, tivemos duas instâncias dentro do governo (Funtelpa x Secult) - pelo menos nos últimos quatro anos - que apoiavam várias manifestações culturais, umas populares, outras eruditas, mas que não estabeleciam uma relação dialógica, um ponto de contato que ensejasse a percepção de uma política de Estado.
Vejamos o caso do carnaval. Com a partidarização, ou melhor, com a tucanização das agremiações carnavalescas de maior apelo popular, assistiu-se durante os oito anos do governo petista em Belém o esvaziamento do carnaval no município de Belém, patrocinado pelo governo estadual tucano, que injetava recursos financeiros e transportava as agremiações carnavalescas para se apresentarem no município de Ananindeua. Enquanto este município era administrado por tucanos, manteve-se como palco das apresentações dessas agremiações de Belém.
Apoio ao carnaval que se resumia ao repasse de recursos públicos. Faltava política para o setor.
Como virtude que se espera ver praticada pela administração petista no Governo do Estado do Pará, acentua-se o respeito e o compromisso com a cultura popular.
Um passo importante para o governo petista seria assumir o compromisso com os segmentos populares: criar espaços para dialogar com os vários grupos que produzem e difundem a cultura popular, tomando a contribuição individual e coletiva desse segmento.
Inconcebível que artistas com lastro nacional e às vezes até internacional ainda fiquem se apropriando dos parcos recursos destinados ao setor cultural devido à ausência de uma política de Estado. Existindo uma política cultural de Estado, é necessário que todos os segmentos estatais possam interagir para a sua efetivação.
A Secult deve assumir a responsabilidade de coordenar a implementação em todo o governo dessa política cultural.
A cultura não deve ser tomada como algo dado, estático, mas como um processo dinâmico, que a todo o momento se recria. Processo influenciado pelas disputas ideológicas dos diversos grupos políticos que disputam a hegemonia da sociedade.
Numa perspectiva democrática a cultura popular deve expressar uma liberdade conscientizada e conquistada nas lutas sociais, que possibilite o convívio e a coexistência social, levando em consideração que as restrições impostas à liberdade de cada um só se legitimam na medida em que garantam a liberdade de todos.
A política possibilita a organização dessas manifestações, e cabe o alerta: deve-se ter muito cuidado para não se legitimar manifestação popular que atente contra os princípios democráticos, a pretexto de que se trata de manifestação da cultura popular e por isso se permite todo tipo de exageros que dificultam a convivência social democrática. Basta lembrar as festas de aparelhagens. A despeito da existência de uma lei que regulamenta os níveis de decibéis permitidos para o funcionamento desses equipamentos sonoros, notícias veiculadas pela mídia paraense demonstram os transtornos causados por eventos em que essas aparelhagens são a atração principal. É só levantar a opinião das pessoas que moram próximas dessas festas para saber o quanto o som alto incomoda. Não cabe ao poder público proibir essas manifestações, deve permiti-las dentro dos padrões legalmente estabelecidos pelo legislativo responsável pela matéria.
Espera-se uma descentralização dos eventos culturais patrocinados pela política cultural do Estado. Nesse sentido a questão cultural permitirá antever a dimensão do compromisso dessa administração com as esperanças depositadas nas urnas da eleição que consagrou a ascensão do Partido dos Trabalhadores ao governo do Estado do Pará.
O que se produziu aqui não foi um texto acadêmico. Estas poucas linhas traduzem a preocupação e ao mesmo tempo a esperança de que a virtude de escutar e assumir compromisso com a cultura popular seja uma realidade benfazeja neste novo governo.
Ps: Na foto, ritmistas e puxadores de samba do Rancho não posso me amofiná. Fonte da imagem: http://www.belem.pa.gov.br
Ps2: O médico, compositor e escritor Alfredo Oliveira escreveu o livro Carnaval Paraense, lançado recentemente, que registra a riquíssima história do nosso carnaval. Mais informações sobre o livro no Portal ORM e no blog do jornalista, escritor e teatrólogo Edyr Augusto Proença: POLAROADS - Carnaval Paraense